Tempo de Jogo:
1130 minutos
Depois de praticamente 19 horas para completar The Last Oricru, me dei conta de duas verdades sobre o jogo. A primeira delas é avassaladora: eu não fazia a menor ideia do que era um Oricru e muito menos porque isso (ele?) seria o último. Esse é o nível da bagunça narrativa, da confusão mental que seus desenvolvedores criaram em um jogo com muitas ambições e pouco polimento.
A segunda verdade é que eu já estava com saudade de seu mundo e de seus personagens.
Esse foi o primeiro projeto próprio da desenvolvedora da República Tcheca GoldKnights, um RPG fortemente inspirado nos trabalhos da Piranha Bytes e que tenta pegar carona na tendência dos Soulslike. Fracassa nas duas referências e acaba criando um resultado único, com sua assinatura, uma obra que está muito longe de ser prima, mas que se destaca justamente talvez por suas idiossincrasias.
Poucas histórias conseguem misturar satisfatoriamente ficção científica com fantasia e essa não é uma delas. Aqui, controlamos Silver, um humano, tripulante de uma expedição da Terra, que desperta no mundo mágico de Wardenia. Ele tem poucas lembranças de sua vida anterior, porém sente que está fora de seu lugar. Por um milagre tecnológico do qual não me recordo mais, Silver (assim como outros três humanos dessa mesma expedição) agora tem o dom da ressurreição: se ele morrer, ele renasce em seguida em outro ponto. Por conta dessa habilidade, ele está sendo treinado como uma espécie de campeão pelos Noborus, a raça dominante do planeta.
Esse é apenas o ponto de partida para uma jornada que vai envolver uma IA fora de controle, manipulação genética, um culto do fogo que reside em um vulcão, uma revolta de escravos, o que provavelmente é uma invasão alienígena e regicídio. Tudo isso em uma história que vai tomar rumos bem diferentes de acordo com as decisões do jogador e tudo isso com um protagonista que é a própria definição do deboche.
Da Piranha Bytes e dos jogos da franquia Gothic, The Last Oricru puxa o sistema de facções, em que o jogador precisa tomar partido e ganhar pontos de influência com esse ou aquele grupo político dentro do mundo do jogo. Infelizmente, não é nada tão complexo: é necessário escolher entre tiranos frios, rebeldes selvagens e uma raça tão obtusamente maligna que chega a ser caricata. Eu me vi constantemente sendo obrigado a optar pelo menor dos males, por aquilo que guardasse a mínima possibilidade de ser justo, apenas para ver rios de sangue vertendo em consequência de meus atos. Acabei me surpreendendo ao chegar, entre muitos erros e alguns acertos, na combinação exata que concedeu a Wardenia um arremedo de paz. Apenas para ver que nem tudo acabou bem durante os créditos finais.
O grande mérito da GoldKnights é tentar construir aqui um jogo verdadeiramente aberto em que o caminho escolhido altera segmentos gigantescos da narrativa. Tive a sensação muito clara de que The Last Oricru não é um jogo, mas três jogos diferentes com três resultados diferentes, convivendo no mesmo espaço. É ambicioso, mas as arestas ficaram expostas. Evidentemente, há explicações e personagens que ficam completamente desprovidos de sentido porque o jogador não escolheu esse ou aquele caminho. Talvez em uma linha do tempo alternativa alguém esclareça o que é um "Oricru", por exemplo. Além disso, algumas costuras não estão bem feitas, com personagens ignorando eventos que participei ou mencionando situações que não vivi.
Essa audácia também é prejudicada pelos diálogos e pela própria dublagem. A história em si já é bastante confusa e demora muito para que as peças se encaixem adequadamente, mas os diálogos frágeis, quase tolos, não ajudam em nada. Essas frases são entregues por dubladores (em inglês, vale dizer) quase amadores. O mais profissional é o dublador de Silver e ele entrega muito bem: um herói com voz de entediado que não entende muito bem como ou por que se meteu nessas confusões. É o modelo padrão dos protagonistas da Piranha Bytes, porém elevado à décima potência, com direito a tiradas tão ridículas que chegam a ser cômicas. A língua ferina de Silver é possivelmente sua melhor arma.
Desde que a From Software começou a faturar quantidades absurdas de dinheiro com seus jogos, todo criador de RPG com contas pra pagar abriu mão de sua dignidade e buscou produzir uma cópia. A sensação que eu tenho é que todos os RPGs ocidentais se passam em universos de fantasia sombria na última década e tem o mesmo sistema de combate, compassado, baseado em bloqueio e esquiva, com inimigos gigantescos. Em seu título de estreia, a GoldKnights atirou em Dark Souls e acertou a escuridão.
Sabendo de antemão que o gênero Soulslike não é de meu domínio, escolhi o modo de dificuldade História (como se a história fosse grande coisa...). O resultado é um sistema de combate extremamente fácil. Basta dizer que, ao longo das 19 horas de jogo, se morri em combate contra meus inimigos foram apenas duas ou três vezes, duas vezes para chefes com ataques de morte instantânea. O que realmente provocou minha morte mais vezes do que eu gostaria foram segmentos de pulo.
Ironicamente, foi esse sistema de combate que manteve meu interesse no jogo. Era muito divertido me esquivar de um ataque ou bloquear, sem perder o timing, ou contornar o inimigo por completo e acertá-lo pelas costas. As animações dos oponentes são longas, então, uma vez que você identifica o padrão, fica muito fácil sobreviver. Reiterando outra vez que estava jogando no "Fácil", por assim dizer. Os chefes foram muito tranquilos, em sua maioria.
A facilidade do combate me permitia fazer uma das coisas que mais curto em RPGs ou jogos de mundo aberto: explorar. The Last Oricru oferece uma arquitetura avassaladoramente bela, com níveis interconectados de múltiplos atalhos e itens secretos espalhados que recompensam o jogador. Novamente, a ambição desmedida da desenvolvedora se manifesta: algumas construções são colossais, muitas vezes você percorre grandes distâncias sem esbarrar em ninguém e, no final das contas, isso tem um grande impacto na performance de renderização. A capital dos Noborus trava de uma forma que quase me fez desistir.
The Last Oricru oferece uma variedade satisfatória de estilos de combate, ainda que desequilibrada. Não experimentei me tornar um mago completo, mas adotei inicialmente o sistema de um espadachim, com espada curta e escudo. Entretanto, tão logo consegui atingir os níveis de Destreza e Força para utilizar uma espada de duas mãos Lendária que tinha ganhado, o jogo mudou completamente. Próximo do final, estava evidente que minha combinação de armas não estava mais acompanhando o nível dos inimigos e eu precisava me concentrar em cada luta. Ao desbloquear a espada de duas mãos, todos os combates ficaram mais fáceis do que jamais foram: com apenas dois golpes impossíveis de bloquear, minha arma destruía os inimigos e ainda me ajudava a recuperar vida.
Recapitulando: diálogos e enredo não são o forte de The Last Oricru. O combate não é o forte de The Last Oricru. Graficamente falando, ele é exuberante, mas os modelos causam estranheza (principalmente os Noborus) e essa qualidade gráfica cobra um preço muito alto em mapas grandes. O áudio cumpre seu papel, mas a trilha sonora não se destaca. Existem mecânicas que eu sequer compreendi (como se minera?).
E, mesmo assim, eu fui até o final. E, mesmo assim, eu curti o jogo. Não há nada em que The Last Oricru seja excelente, em todos os quesitos ele é mediano, na melhor das hipóteses. Então, estarei louco?
Análise completa em: [url=https://blog.retinadesgastada.com.br/2024/09/jogando-last-oricru.html]https://blog.retinadesgastada.com.br/2024/09/jogando-last-oricru.html[/url]
👍 : 9 |
😃 : 1