Avaliações de Concealed

Tl;dr: Pule para o último parágrafo. “Concealed” é uma visual novel chinesa feita de maneira independente por dois desenvolvedores, sendo essa uma continuação espiritual da visual novel “Ghost in The Pool” que foi lançada pelos mesmos desenvolvedores em 2021. “Ghost in The Pool” é uma visual novel curtinha de terror com um visual muito estilizado ao estilo mangá que se utiliza desse contraste do preto e branco para trazer um visual muito bonito e bastante medonho no melhor estilo Junji Itou, já que o terror aqui está mais voltado para o paranormal utilizando-se de um certo exagero para causar desconforto com o bizarro. Não é um trabalho perfeito, sendo possível notar uma falta de polidez nas mecânicas e um certo número de bugs. Outra crítica que tenho quanto a ele é que essa tradução do chinês (que acredito ser o mandarim) para o inglês veio um tanto problemática quando se nota vários erros de digitação e algumas frases que claramente foram traduzidas de maneira um tanto literal. Apesar desses problemas, esse foi um trabalho que eu gostei muito, o que me deixou muito curioso para conhecer o que os desenvolvedores fariam mais para frente. “Talvez o próximo trabalho tenha tudo para estourar a bolha e fazer um grande sucesso!” – foi o que pensei. Pelas imagens e informações promocionais, ficou claro que a ideia de “Concealed” foi a de não apenas aprimorar ainda mais a parte técnica para nos trazer novamente um visual lindíssimo, mas também a de aumentar o escopo do jogo para mostrar uma história melhor aprofundada e com conexões a “Ghost in The Pool”. Além disso, Yamaoka Akira realizou um trabalho de composição, a música de encerramento chamada “Unmei no Ito”; o que mostra que vem sendo feito um investimento nesses jogos e que há confiança no projeto. Com esse histórico, comprei o jogo logo no lançamento. A questão é que “Concealed” não é “Ghost in The Pool”, e apesar de se parecer muito com o jogo anterior artisticamente, a proposta aqui é outra; mesmo que haja um esforço muito grande em conectar as duas experiências, o que na minha opinião foi o que gerou o meu maior problema com a história. “Concealed” é um jogo lento, muito lento; com um primeiro capítulo demorando todo o tempo do mundo para introduzir os personagens até chegar a um ponto de se tornar um slice of life. A trama central se inicia após várias horas de jogo com o desaparecimento da garota Han Qi, e assim começa a se desenrolar uma história de mistério envolvendo mais desaparecimentos, e até mesmo assassinatos, em que a protagonista Meng Jiang’Nan precisa juntar todas essas peças desse quebra cabeça e descobrir o que está acontecendo. Em sua essência, “Concealed” não é exatamente uma história de terror, sendo algo mais voltado para o mistério. Claro que esses dois gêneros andam muitas vezes de mãos dadas, mas a forma como isso foi conduzido aqui me causou um estranhamento, já que do nada temos momentos aleatórios de terror paranormal que não possuem qualquer ligação com o que está acontecendo na história, sendo mais uma referência ao jogo anterior do que qualquer coisa. Eles vão acontecendo esporadicamente até chegarmos na metade do jogo, que é quando as coisas começam a ficar realmente ficar boas. Até esse momento, a narrativa vai se desenrolando com a protagonista passivamente recebendo atualizações de outros personagens sobre os mistérios que estão acontecendo até a hora em que fatidicamente ocorre um assassinato em que a personagem decide tomar uma atitude e fazer um trabalho de campo: ir aos lugares, interrogar as pessoas, juntar evidências, teorizar o passo a passo do crime, e levantar suspeitos. A partir daí o jogo fica muito bom, com o terror sendo muito mais sobre a brutalidade do crime e o medo gerado da desconfiança já que o assassino pode ser da mesma sala de aula que a protagonista. A escola em que Jiang’Nan estuda é muito rígida e os alunos precisam se dedicar aos estudos mesmo fora dos períodos sem aula, isso somado aos problemas de relacionamento com a melhor amiga, contradições socioeconômicas e toda aquela incerteza do futuro e o estresse da adolescência acaba criando um clima angustiante que contribui para a experiência. Em resumo, depois de um ritmo muito lento e após muitas horas de jogo, a trama vira do avesso e a história se torna muito interessante a ponto de existirem momentos de reviravoltas capaz de causar muitas emoções. Eu também gosto muito de alguns personagens: as meninas do trio investigativo são muito divertidas e realmente senti que poderia confiar a minha vida à Yuan Min, as duas fangirls que sempre possuem diálogos muito engraçados, a melhor amiga de Jiang’Nan que possui muitas contradições e oferece momentos de marejar os olhos; fora outros personagens que também esbanjam personalidade e que possuem suas qualidades e defeitos. Não vou dar spoiler sobre a reta final do jogo, mas é que tem só uma coisinha ali que me deixou com uma pulga atrás da orelha que me fez pensar em algumas coisas. Não me considero um entendedor de história da China, mas aparentemente em um momento do final bom existe uma crítica à Revolução Cultural de Mao Zedong em meio a uma conversa entre mãe e filha, e agora eu fico pensando comigo sobre qual é a posição política dos desenvolvedores. Concordo que esse foi um período em que foram cometidos muitos excessos e um movimento que merece sim receber críticas, mas eu achei um pouco curioso isso vir assim do nada, me pegou de surpresa. As contradições socioeconômicas e a "pessoa comum" que é "enganada" e "devorada" pela elite foram até então temas presentes em uma história que se passa em uma escola de gente rica com uma narrativa focada nesses alunos que possuem visões problemáticas e um tanto elitistas. Qual foi a ideia aqui? Falando sobre a parte da jogabilidade, temos aqui alguns problemas que não deveriam, coisas básicas de visual novel que acredito que seja ponto passivo para a comunidade: Quando comecei, o jogo não tinha função de pular textos já lidos, e mesmo depois que implementaram essa função, eu ainda não acho que ficou legal, pois além de ser um tanto devagar, você ainda precisa clicar para mudar o texto. A situação fica ainda pior quando você percebe que ao salvar manualmente, você não continua o progresso do exato momento em que salvou o jogo; ao carregar, você retorna do exato momento em que o jogo troca de cenário em meio a seção em que o jogo foi salvo. É confuso e desorientador, além de ser um pé no saco para aquele jogador que gosta de salvar antes de decisões importantes para melhor ter a experiência dos caminhos alternativos. Isso torna um jogo que já é lento, mais lento ainda. O jogo possui um menu em que ficam registrados todos os principais personagens, o que é bom para quem não está acostumado com nomes chineses, já que isso ajuda muito na hora de relembrar quem é quem. Além desse registro dos personagens, temos um “glossário” que na prática tem um papel de “educar“ o jogador que não é chinês a ter um maior entendimento da cultura, mas que para ser sincero, um registro das principais evidências para melhor acompanhar o caso, faria mais sentido. A tradução para o inglês ainda continua estranha assim como era em “The Ghost in The Pool”. Isso não significa que a tradução seja ruim, é possível entender o que está acontecendo, mas é uma tradução um tanto literal demais, o que causa estranhamento. Fora isso, temos muitos erros de digitação e uma padronização de nomes não consistente que pode confundir. Em conclusão, eu gostei de “Concealed”. É um jogo visualmente belíssimo que tem uma história muito instigante e criativa, mas é inegável que existe um problema de ritmo e talvez de foco na narrativa; com probleminhas técnicos da tradução para o inglês também não ajudando muito. Recomendo apenas caso você seja uma pessoa muito paciente e que sabe bem onde está se metendo. Ainda não é o jogo da Cascha Games que será responsável por estourar a bolha, mas acredito que esse momento ainda virá.